Adeus às armas
O planeta se aproxima do momento da transformação em mundo de regeneração, tantas vezes profetizada como consequência natural da lei de evolução regendo não somente o princípio material, quanto o espiritual. Há uma expectativa imensa dos que há bom tempo tomaram conhecimento desta tão esperada realidade, e assim aguardamos.
Quando poderemos avançar, moral e eticamente, e encontrar, finalmente, um pouco de paz em nossas vidas diante de tantas incertezas presentes? indagamos ansiosos.
Quanta esperança poder viver mais próximos uns dos outros, aproximando-nos mais da condição de verdadeiros irmãos, juntos progredindo a passos largos, um ajudando o outro na corrida da vida rumo ao prêmio maior: a perfeição relativa e a completa integração com o Pai!
Nada obstante, exatamente quando a Humanidade como um todo almeja ardentemente dias melhores, alguns enxergam como solução o uso da força para conquistar a tal almejada felicidade, esquecendo-se de que, ao possuir uma arma, está implícito o desejo de usá-la, lamentavelmente, contra outro ser humano.
O mais surpreendente é que muitos dos apoiadores desta estapafúrdia proposta são religiosos, outros, pasmem, religiosos também e adeptos e seguidores da proposta formulada por Allan Kardec, Doutrina que cataloga, entre muitos dos seus nobres princípios, exatamente o que ratifica a não violência, priorizando sempre a busca pela pacificação.
Conta-se que perguntaram a um espírita se ele algum dia compraria uma arma e a resposta foi categórica e realmente sábia: Jamais! Diante de tão positiva e pronta resposta, dita com plena convicção, formulou-se outra, questionando agora por qual razão? e a nova e correspondente resposta foi extremamente lúcida: Não desejo matar ninguém nesta vida! Espantosamente, este mesmo dito discípulo do mestre lionês e, portanto, cristão, anos mais tarde votou contra o proposto estatuto do desarmamento, pois não comungava com as ideias políticas dos idealizadores daquela campanha.
Observa-se, neste curto relato, a sabedoria baseada em conceitos espíritas, quando o irmão acima referido justificou a sua primeira posição expressando o desejo de não abreviar a existência de ninguém, nesta vida, porquanto sabemos que, em função de nossa forte ligação com este planeta de provas e expiações, é extremamente provável já termos tirado a vida não de apenas um, mas de muitos semelhantes em existências pregressas; no entanto, ele anulou o exemplo cristão oferecido na primeira resposta dada, quando votou contra o desarmamento, agora em função de posicionamentos políticos. Uma pena...
A violência jamais impedirá a violência, como os postulados espíritas, traduzindo as leis divinas, já nos orientaram reiteradamente. Mesmo assim, em pleno século XXI, temos muitos - vamos alargar um pouco mais o universo dos adeptos desta proposta – cristãos, alegando só poderem conter os atos violentos perpetrados corriqueiramente, armando-se, lutando de igual para igual, fogo contra fogo, arma contra arma, em uma demonstração inequívoca de que ainda não consolidaram certos entendimentos doutrinários, que nada mais são do que expressões das Leis do Criador, muitas delas trazidas há dois mil anos pela personificação máxima da brandura: o inesquecível Cristo Salvador.
Façamos um ligeiro e despretensioso exercício de imaginação:
Como os verdadeiros cristãos poderiam ter deixado à posteridade exemplos tão eloquente de fé quanto os que deram ao se entregarem resolutos, pacificamente, felizes, aos desatinados romanos que os imolaram aos milhares?
Francisco de Assis seria hoje tão conhecido e venerado, se houvesse usado de atitudes agressivas contra aqueles que não entendiam o alcance de sua proposta de viver com humildade e na pobreza?
Como a “grande alma” - Mahatma Gandhi -, poderia ter sobrepujado o poderoso império britânico, aquele sobre o qual diziam que o Sol jamais se punha, se houvesse utilizado da violência como ferramenta de luta e libertação, e não apenas os seus ideais da não violência? É de se notar ter Gandhi morrido pela ação de uma arma de fogo manuseada por um adversário cruel.
Finalmente, teria Jesus alcançado o patamar por Ele atingido de exemplificação de uma vida inteira de cordura e mansuetude, se tivesse enfrentado com violência os obcecados fariseus que o combatiam sistematicamente, bem como o mundo antigo que de modo algum o compreendia?
Sim, pacificadores vêm se apresentando no caminhar da Humanidade, legando incomparáveis modelos de mansidão à posteridade, plenamente contrários aos amantes da violência, da selvageria, da iniquidade, resquícios bem vivos ainda por depurar, oriundos das primitivas e bárbaras encarnações pelas quais todos nós experimentamos.
É de se lamentar assistir a cristãos ávidos por matar os poucos que ainda vivem segundo ferozes princípios, porquanto, estes, nada mais são do que frutos amargos de nosso próprio modo de vida, da nossa própria semeadura, de como temos mal dividido os generosos recursos oferecidos pela mãe Terra, resultados diretos da negligência que temos tido com os mais fracos e necessitados, mormente com a educação de nossas crianças, por séculos.
Qual é a nossa participação neste cenário moderno e aparentemente caótico a nos caracterizar? Somos nós mesmos que por aqui estivemos em pregressas existências e, quem sabe, se merecermos, neste mundo estaremos no futuro.
A propósito, enquanto escutamos insistentemente sobre propostas armamentistas, absolutamente nada ouvimos sobre novos e ajuizados projetos visando à Área da Educação, mormente endereçados àqueles agora aportando mais uma vez na escola Terra. Precisamos de professores motivados, adequadamente remunerados, livros, salas de aulas, uma boa internet, em suma, boas escolas e não de armas!
Quem fere com a espada, com a espada será ferido! Esta máxima, pronunciada há muitos séculos pelo Amorável Rabi da Galileia e plenamente ratificada pelo monumental edifício do conhecimento espírita, não é suficiente para acalmar o nosso íntimo, aplacar esta sede de vingança, este fogo destruidor que queremos lançar sobre os nossos agressores? Após a publicação dos compêndios espíritas, há mais de 150 anos, alguém ainda acredita no acaso?
Sobre esta impossibilidade podemos recordar o Espírito André Luiz1 quase ao final de uma, entre tantas, lúcidas mensagens de sua autoria:
O espírita está informado de que o acaso não existe.
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Esquivar-se do uso de armas homicidas, bem como do hábito de menosprezar o tempo com defesas pessoais, seja qual for o processo em que se exprimam.
Será crível tal posicionamento de seres que alcançaram o reino dos humanos!? Qual exemplo daremos às nossas crianças quando assumimos a posição de que precisamos nos defender a qualquer preço, mesmo sendo ao custo da morte do pecador?
Onde está o bom senso? O equilíbrio? O perdão? Tamanho desatino!
Imaginemos se os cristãos não tivessem se imolado com alegria, nos deixado aquele testemunho eloquente de fé, pois convictos estavam sobre a continuidade da vida? Qual resultado esperamos alcançar, tirando a vida do semelhante?
Alguns desatinados, embora se dizendo cristãos, tresloucados pelo materialismo vigente, parecendo imperar nos corações e mentes, poderiam argumentar: antes ele do que eu!
Tempos sinistros estes caracterizando o início do século XXI. A Humanidade avançou sobremaneira no entendimento dos deveres e direitos, boas leis são promulgadas a todo o momento para tentar ajustar a sociedade na busca da paz e da tranquilidade, contudo, a nossa parte da Humanidade, os brasileiros, estão desejosos de possuir uma arma, um instrumento de morte, quando Jesus sempre nos ensinou existir apenas vida, e vida em abundância.
O título deste breve texto foi retirado do livro mundialmente conhecido escrito por um famoso pacifista, o escritor americano Ernest Hemingway – Adeus às armas. A obra se desenvolve como um romance, entretanto abordando os horrores da Primeira Guerra Mundial, deixando uma mensagem para a Humanidade: a de que não há nada glorioso nos conflitos armados. Cremos que podemos usar a advertência desse talentoso escritor para igualmente afirmar: não há nada cristão na conduta de se armar para matar o seu próximo.
Assim caminha a humanidade há milênios, entre modestos acertos e fragorosos enganos. Contudo, não precisa ser assim, não há por que ser desta forma, porém, se escolhermos as armas, na suposição de que estas detêm o poder de nos trazer a tão almejada paz do Cristo, estejamos certos de que muito em breve desejaremos impacientemente livrar-nos de todas elas, mais uma vez, plenamente cônscios de que jamais a violência poderá ser usada para combater a própria violência.
Lembrando ensinamento antiquíssimo, recordemos ainda uma vez mais: Bem-aventurados os mansos, porque herdarão a Terra (Mateus, 5:5; grifo nosso); e, se a nossa memória não nos trai, esta profecia não foi revelada pelo Cristo de Deus!?
Rogério Miguez
Referência:
1 VIEIRA, Waldo. Conduta espírita. Pelo Espírito André Luiz. 13. ed. Rio de Janeiro: FEB, 1987. cap. 18. Perante nós mesmos.