quinta-feira, 15 de março de 2018

Crônica espírita: "Da matança de cães em Igaracy-PB e do que o Espiritismo oferece à sociedade" por Ery Lopes


Nascido e criado em Igaracy, eu passei a infância e a juventude sonhando com a minha pequena cidade — que mal figurava no mapa — aparecendo na televisão; quem sabe, destacando a arte ou feito heroico de algum conterrâneo. Aconteceu, porém, mais de duas décadas depois de abraçar o destino de retirante, assistir, de muito longe, aos principais noticiários nacionais reportando um triste acontecimento na minha querida terra natal, episódio esse que nos enseja uma reflexão muito oportuna sobre o trato com os animais e, coisa ainda mais significativa, como falta à humanidade a luz que o Espiritismo nos oferta.


O triste acontecimento a que me refiro é o da execução de dezenas de cães (veja aqui) que, supostamente por apresentarem doenças nocivas à população igaraciense, foram submetidos à eutanásia por intervenção da Secretaria Municipal de Saúde, mas, segundo acusações diversas dos moradores da cidade, o sacrifício foi feito sem uma devida avaliação clínica de cada bicho e, pior, efetivada com "requintes de crueldade", tanto que a OAB-PB - Ordem dos Advogados do Brasil, seccional da Paraíba emitiu uma nota de repúdio contra essa matança (veja aqui).


Enfatizo que não adentrarei aqui na questão das responsabilidades diretas desse caso específico, que são cabíveis às autoridades legais; mas gostaria de aproveitar o episódio para refletir um pouco sobre a generalidade do problema que abarca tal temática e, com isso, evidenciar o quanto a Doutrina Espírita nos tem a oferecer como orientação prática para resoluções de nossos problemas e soluções para a sociedade. Fosse o Movimento Espírita mais influente no nosso país — justamente o pais de maior percentual de "espíritas praticantes— e casos como esse (da suposta crueldade com os animais), ocorrido em Igaracy-PB, provavelmente não se dariam. Se bem, é de se destacar certo avanço moral da nossa sociedade expressado pelo sentimento comum de revolta da população com o ocorrido, ainda que muitas vezes seja mais efeito da mídia do que propriamente em preocupação com os bichos.


Sem o entendimento espírita, a questão da valia dos animais para o homem e para o mundo fica à mercê de variáveis como a da mera concepção científica, da necessidade para sustentação do ecossistema (pela cadeia alimentar), ou o de puramente emocional, no caso dos chamados bichos pet, domesticáveis. Mas o Espiritismo vem nos convidar a uma análise mais ampla, considerando assim não somente a estrutura organizacional da Terra ou do nosso Universo físico, mas também levando em conta a natureza espiritual, que tem a ver com o ensaio pelo reino animal que as individualidades provindas do princípio espiritual efetuam na sua escalada até alcançar o estágio apto a penetrar no ensaio hominal, pelo que vale a pena conferir essa matéria. Nessa conjectura, o trato do homem para com os animais em geral precisaria ser repensado sistematicamente. Desta feita, a dita matança de cães de Igaracy não pode ser figurada como barbarismo maior do que a farra das churrascadas, corriqueiras em todo o Brasil e mundo afora. E mais profundamente deveríamos repensar ideias como a da eutanásia — não apenas aplicada a humanos, mas igualmente aos animais.

De uma maneira geral, o abreviamento de uma instância reencarnatória é uma interrupção em seu curso evolutivo. Os animais cumprem nos estágios terrenos um processo imprescindível de progressão da individualização de sua essência espiritual que, aliás, segundo informações generalizadas da espiritualidade, só se dá enquanto encarnado, e nunca no mundo espiritual. Dizem os mentores do além que, em seguida ao um desencarne, a "alma animal" (vamos usar esse, na falta de um termo melhor) reencarna praticamente de imediato, o que não impede que haja prejuízo no caso de a reencarnação anterior ter sido abreviada abruptamente.


“Pela influência que exercem, as ideias espíritas são uma garantia de ordem e tranquilidade, pois tornam melhores os homens uns para com os outros, menos ávidos de interesses materiais e mais resignados aos decretos da Providência." 
Allan Kardec (O Livro dos Espíritos - 'Conclusão', item VI)


Enquanto impera a desinformação quanto a esses valores da natureza maior, vigorará matanças como essa, ocorrida de Igaracy, e tantas outros atentados aos nossos "irmãos menores". É claro que o desconhecimento atenua as responsabilidades de quem atente contra esses princípios, porém nem tanto quando já se fizerem presentes os meios de se adquirir a devida ciência. E já estamos numa fase bastante madura para assumirmos tais compromissos com a espiritualidade.


O grande problema pelo qual passamos atualmente é o da polarização das opiniões, e mesmo dos extremismos correntes em qualquer discussão. A partir daí temos vista o afloramento de uma correnteza de ódio assustadoramente irracional. Pegue-se o exemplo hoje de Igaracy e note-se a politização que estão fazendo. De repente, o secretário, o prefeito e todos os seus simpatizantes mais estão sendo totalmente satanizados por um ato falho, assim como se sataniza alguém por ser desse tal partido político, ou por ser torcedor de tal time, ou praticar tal religião, etc. Por outro lado, quando há qualquer vínculo de interesse particular, defende-se, com unhas e dentes, tudo e qualquer absurdo provindo de um correligionário qualquer, não raro idolatrando-o, tudo em nome de uma discussão ideológica qualquer que na maioria das vezes mascara um materialismo profundamente perverso. Nessas condições, como aprofundar temas tão importantes e apascentar tamanha anarquia?

Como espírita, desejaria muito que nosso movimento espírita fosse mais eficaz na educação dos conceitos espirituais, dentre os quais — e sobretudo — o da caridade. Mas até mesmo entre nossos confrades o sentido dessa palavra parece tão superficial, quase limitado a distribuir cestas básicas e sopinha aos moradores de rua, que chego a pensar mesmo que talvez devamos todos passar por um choque ainda maior de realidade — com muito sofrimento, por consequência de nossas negligências — e esperar por uma quarta revelação, já que o Espiritismo tem sido muito distorcido.


Entretanto, nada de desânimo, sejam quais forem as circunstâncias, como espírita, melhor do que ninguém, sabemos que a Luz é soberana sobre as trevas e nenhum esforço, por mínimo que seja, é inútil. Se se recrudesce o mal, reforcemos nossa fé e dobremos nossas ações para semear a tolerância com os "diferentes", semear a concórdia em torno dos valores espirituais, semeemos, enfim, a boa nova do Cristo tão bem interpretada pela Doutrina Espírita, para que, guiando-se por esses princípios salutares, nossa sociedade supere todas as diversidades que se nos apresentam, certos de que o "Reino de Deus" que suplicamos na oração paternal não cairá dos céus, mas deve ser erguido, com o concurso dos bons Espíritos, mas substancialmente através da nossa contribuição.

Espiritas, façamos mais e melhor para semear a mensagem de luz do Espiritismo! E doravante que a minha amada Igaracy nos traga melhores notícias!
Ery Lopes

2 comentários:

  1. Vivei e deixai viver
    Eu sou a voz daqueles que não falam;
    e através de mim o mudo vai falar
    até que o surdo ouvido do mundo
    seja aberto para escutar
    as injustiças contra o fraco,que não sabe se expressar.
    A mesma força formou o pardal
    o rei, a criatura moldada:
    Tanto para seres de pele como de pena,
    pelo Deus do Todo
    uma centelha da alma, a cada um lhe foi dada.
    Eu sou o guardião de meu irmão,
    e até que o mundo corrija as coisas
    a luta dele lutarei,
    e para animais e aves
    a palavra falarei.
    ELLA WHEELER WILCOX

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  2. Do ponto de vista ético moral, perfeito. Todos apoiam. Quanto ao fato de se o espiritismo fosse mais divulgado isto não aconteceria é um equívoco, pois as outras religiões defendem os animais. Portanto, o problema é cultural e não de disseminação de moral religiosa espírita. Outro equívoco a informação de que os animais reencarnam de imediato, pois para um ser encarnar é preciso que haja um feto e uma mãe disponível na natureza e nem sempre isto acontece. Nos grandes eventos sísmicos milhões de criaturas são mortas em poucas horas e várias espécies desaparecem, não conseguindo mais reencarnar. Necessário rever a teoria, pois não se aplica em relação ao conhecimento científico atualmente disponível. No mais, uma boa defesa dos animais.

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