sexta-feira, 26 de abril de 2024

160 anos de O Evangelho segundo o Espiritismo, por Luís Jorge Lira Neto



Dando sequência à nossa série comemorativa pelos 160 anos do lançamento de O Evangelho segundo o Espiritismo de Allan Kardec, colocamos para a apreciação geral mais um excelente artigo temático, este assinado por um dos mais competentes estudiosos do Espiritismo em nosso tempo: nosso amigo alagoano, mas residente em Recife - PE, Luís Jorge Lira Neto, doutorando em Ciência da Religião pela UNICAP, membro efetivo do Instituto Arqueológico Histórico Geográfico Pernambucano, membro da Associação Brasileira de Divulgadores do Espiritismo (ABRADE) e colaborador da Associação Espírita Casa dos Humildes na Veneza Nordestina.

Neste texto primoroso, Luís Lira nos oferece uma reflexão ímpar sobre o nome original do livro que estamos homenageando, conforme a publicação da sua primeira edição em 1864. E mais, o articulista nos convida a considerar que talvez o título "Imitação do Evangelho segundo o Espiritismo" fosse não apenas bem aplicado, mas muito mais preciso que o seu substituto, que é o título que conhecemos hoje. Vamos então conferir e mergulhar nesse pensamento, com espírito crítico e alma aberta para justas cogitações.

Confira abaixo!


Imitação do Evangelho Segundo o Espiritismo
Luís Jorge Lira Neto
luis.lira.al@gmail.com

Nesse mês e ano comemora-se os 160 anos da publicação do livro Imitação do Evangelho Segundo o Espiritismo, abril de 1864, contendo “a explicação das máximas morais do Cristo, sua concordância com o Espiritismo e sua aplicação às diversas posições da vida” (Kardec, 2014, folha de rosto). Considerada a terceira obra fundamental da Doutrina Espírita de autoria do francês Allan Kardec, o fundador do Espiritismo – doutrina filosófica do século XIX concebida como proposta conciliatória entre a ciência e a religião, a solução para o dilema da modernidade entre fé e razão. A abordagem aqui será pelo viés literário da obra, em relação ao título, vez que, há outras como a historiográfica, doutrinária, exegética e analítica discursiva. 

De início, um exame sobre o título original da obra que passou por um processo de discursão e de mudança. É fato conhecido na atualidade [1] que Kardec tinha anunciado a publicação de uma nova obra desde 1862, intitulada “As Vozes do Céu - leituras atuais sobre as diferentes partes do ensinamento moral dos espíritos”. Decerto, na Introdução da primeira edição do livro informou que “As instruções dos Espíritos são verdadeiramente as vozes do Céu que vêm esclarecer os homens e convidá-los à imitação do Evangelho” (Kardec, 2014, p. 24). Evidenciando sua intencionalidade em vincular as instruções dos Espíritos à simbólica expressão “as vozes dos céus”, colhida na mensagem que prefaciou a obra, que junto ao termo “imitação do Evangelho” explicita a influência dos Espíritos na obra e a finalidade do livro, qual seja, esclarecer passagens evangélicas e convidar a humanidade a imitá-las.

No entanto, a escolha do título Imitação do Evangelho Segundo o Espiritismo trouxe incômodos a algumas pessoas, principalmente, ao editor do livro, Sr. Didier [2]. Diante disso, Kardec aborda o assunto em um diálogo com o Espírito Dr. Demeure e o Espírito de Verdade (Comunicação/Diálogo, 1865, 217#) [3]:

Pergunta [Kardec]: Meu editor, o senhor Didier, insiste fortemente para que eu mude o título da Imitação do Evangelho. Ele afirma que a palavra imitação tem algo de muito místico e lembra por demais as obras católicas da Imitação de Jesus Cristo, da Imitação da Virgem [4] e outras; que isso prejudicaria a venda para o público alheio ao Espiritismo. Por outro lado, outras pessoas consideram este título excelente e me pedem para mantê-lo.

A questão é importante porque diz respeito ao sucesso da obra, e é sobre este ponto que gostaria de uma opinião.

[...]

Pergunta [Kardec]: Apelo ao Espírito de Verdade.

Resposta [Espírito de Verdade]: [...] É preciso alterar o título da sua última obra.

Eu [Espírito de Verdade]: Eis [ilegível] categórico. Ao intitulá-la, por exemplo: A moral do Evangelho segundo o Espiritismo, ela se enquadrará melhor com o que está por vir e que terá como título: Os milagres e as predições do Evangelho segundo o Espiritismo; será mais bem compreendido em sequência.

A resposta do Espírito de Verdade converge para a necessidade de se alterar o título da obra de Kardec, o que ocorreu na segunda edição quando foi adotado O Evangelho Segundo o Espiritismo. Em análise sucinta, verifica-se que o desconforto do editor com o primeiro título se prendeu mais à questão mercadológica do que doutrinária, vez que, a publicação em 1864 marcou o início do período religioso do Espiritismo, como definido por Kardec. Quanto ao aspecto místico do título, isso depende do referencial em que se apoiou para assim qualificá-lo.

O fato é que a publicação da obra provocou uma “uma dobradura” na orientação dos postulados doutrinários espíritas, inaugurados em O Livro dos Espíritos e continuados em O Livro dos Médiuns, nela, Kardec posicionou o Espiritismo na linha da tradição cristã, em concordância em pelo menos quatro itens: 1) é a Terceira Revelação da Lei de Deus, na linha judaico-cristã; 2) desenvolve, completa e explica a mensagem de Jesus; 3) é a chave para compreender muitos pontos do Evangelho, da Bíblia e dos outros autores sacros e; 4) é o Consolador prometido e o Espírito de Verdade o preside, tal qual anunciado por Jesus. A partir dela, as demais obras fundamentais seriam lançadas sob o período religioso com: O Céu e o Inferno ou A Justiça Divina Segundo o Espiritismo (1865), uma análise comparada das doutrinas pagã, católica e espírita; e A Gênese, Os Milagres e as Predições Segundo o Espiritismo (1868), um estudo do livro Gênesis (do Pentateuco Hebraico), complementado com as explicações dos Milagres e as Predições dos Evangelho. Portanto, ambas têm um conteúdo interpretativo de textos bíblicos à semelhança de O Evangelho Segundo o Espiritismo.

A relevância da análise do significado do título da obra é singular por este sintetizar o que o texto declara em relação ao seu conteúdo. O título original do livro – Imitação do Evangelho Segundo o Espiritismo tem uma significação mais complexa do que aparenta na sua simplicidade da imagem poética do termo Imitação. Decompondo os termos desse enunciado-sintético nos seus signos para expandir seus significados e, justapondo-os, compreender o que o título estabelece entre o conteúdo e a mensagem ao leitor:

1. Imitação – remete na atualidade a: “O ato de tomar alguém como modelo: imitar um mestre” (Imitation, 2024, tradução nossa), ou seja, agir de acordo com um referencial. [5]

2. Evangelho – é um gênero literário único donde existem quatro relatos: Mateus, Marcos, Lucas e João. É um exemplar sui generis, sem outras ocorrências na literatura. É a narração em prosa e poética, da vida e da morte de uma personagem, Jesus Cristo, mas apenas os fatos e feitos significativos para um determinado fim, sua própria narrativa (Oliva Neto, 2020, p. 11-15).

3. Segundo – na atualidade “em conformidade com algo, de acordo com, agir de acordo com sua vontade” (Selon, 2024, tradução nossa) [6].

4. Espiritismo – é uma ciência de observação e uma doutrina filosófica. Consiste nas relações do mundo material com os Espíritos e nas consequências morais decorrentes dessas relações (Kardec, 2011, p. 11).

Segundo Oliva Neto, o gênero antigo que mais se aproxima do Evangelho é o que se denomina hoje de “biografia” – relato dos fatos mais importantes da existência de uma pessoa para conhecer seu caráter e, se o caráter e ações dessa pessoa forem virtuosos, o leitor será convencido a imitá-los (2020, p. 12).

Assim, o significado do signo Imitação, no contexto do título justaposto ao significado do signo Evangelho, é seguir Jesus como modelo, pois, se depreende dos relatos do Evangelho que seu caráter e ações foram virtuosos, logo deve ser imitado. Isso está em linha com o quesito 625 de O Livro dos Espíritos que referencia Jesus como “guia e modelo” de perfeição moral para a Humanidade terrena:

625. Qual o tipo mais perfeito que Deus ofereceu ao homem, para lhe servir de guia e modelo?

- Vede Jesus.

Jesus é para o homem o tipo de perfeição moral a que pode aspirar a Humanidade na Terra. Deus no-lo oferece como o mais perfeito modelo e a doutrina que ele ensinou é a mais pura expressão de sua lei, porque estava animado do Espírito divino e foi o ser mais puro que já apareceu na Terra (Kardec, 1974, p. 271). 

Em seguimento à análise, verifica-se que não basta seguir a Jesus observando suas máximas morais, mas deve fazê-lo “segundo o Espiritismo”, em concordância com essa doutrina filosófica de consequências morais. E como seria essa concordância? Inicialmente, com a escolha e explicações dessas máximas usando o método espírita, o qual preceitua que para ser aceito um princípio válido, ou paradigma, faz-se necessário aplicar o Controle Universal do Ensino dos Espíritos, detalhado no item II da Introdução do livro, o que originou questionamentos por parte de alguns estudiosos, por entenderem que esse assunto caberia melhor em O Livro dos Médiuns, no capítulo Do Método. Kardec, provavelmente, o inseriu em O Evangelho Segundo o Espiritismo com o propósito de apresentar os parâmetros sob os quais elaborou este livro de doutrina.

O método consiste em duas etapas para validação de um ensino ou revelação dos Espíritos: 1) “O primeiro controle, é, incontestavelmente, o da razão, ao qual é preciso submeter, sem exceção, tudo o que venha dos Espíritos” (Kardec, 2014, p. 26). Seria o bom senso utilizando-se de uma lógica rigorosa e de dados positivos, obtidos por método científico (as vozes da humanidade terrena) – a análise discursiva das mensagens pelo critério da racionalidade. 2) o segundo controle está na “concordância que exista entre as revelações que eles façam espontaneamente, por meio de grande número de médiuns estranhos uns aos outros, e em diversos lugares” (Kardec, 2014, p. 27), é o da concordância dos ensinos dos Espíritos ditos espontaneamente (as vozes dos céus) – a análise de conteúdo das mensagens espíritas pelo critério da similaridade. 

Depois de validada a informação/revelação pelo duplo critério – o da lógica e o da concordância dos ensinos, atendendo seus condicionantes – os dados positivos e as revelações espontâneas diversificadas, procede-se com o comparativo aos princípios básicos do Espiritismo já estabelecidos nas obras fundamentais da Doutrina Espírita – o padrão de aferição. Pode-se inferir, então, que as Instruções dos Espíritos colocadas por Kardec no livro passaram por esse método de validação. 

De acordo com a análise acima, entende-se que o título original da obra, Imitação do Evangelho Segundo o Espiritismo estava adequado ao objetivo, à finalidade e à estrutura do livro. A análise textual dos signos e dos significados apresenta, uma possível significação do título:

Imitar Jesus, por ser o guia e modelo para a humanidade terrena, segundo as máximas morais extraídas do Evangelho pelo método espírita e em concordância com os princípios básicos do Espiritismo. 

Se é Imitação do Evangelho a seleção das narrativas deve: 1º) ter apenas as de teor ético, porque é terreno neutro das controvérsias; 2º) ter o critério da universalidade, porque é para uso de todos; 3º) abranger as circunstâncias da vida pública e particular, porque é uma regra de conduta prática, e; 4º) ter um roteiro para a felicidade futura, porque é o desvelar da vida espiritual.

Se é Segundo o Espiritismo tem que: 1º) aplicar o método científico, porque é ciência de observação; 2º) concordar com seus princípios fundamentais, porque é doutrina filosófica; 3º) ter consequências morais, porque é do domínio da ética e; 4º) convergir com a linha histórico-cultural, judaísmo e cristianismo, porque é a “Terceira Revelação da Lei de Deus”.

A própria estrutura do texto representa essas características. Segue uma estrutura tripartite com: 1º) Textos do Evangelho selecionados segundo critérios descritos acima, 2º) Dissertação de Kardec que analisa o tema sob o ponto de vista do Espiritismo e, 3º) Instruções Espíritas, mensagens instrutivas dos Espíritos referentes ao assunto, selecionadas por Kardec segundo o Critério Universal do Ensino dos Espíritos. Esse esquema está correlacionado com o objetivo da obra, materializada na seleção das máximas do Cristo nos textos do Evangelho, em concordância com o Espiritismo, segundo a análise de Kardec e sua aplicabilidade na vida cotidiana, exemplificada nas mensagens espirituais. Segundo o autor, a obra é de interesse geral, todos podem obter ensinamentos para conformação de “sua conduta pessoal à moral do Cristo” e as instruções dos Espíritos são um convite à “imitação do Evangelho” (Kardec, 2014, p. 24).

Por essa análise, este livro é um código de conduta universal, com base na ética extraída da narrativa dos ditos e feitos de Jesus – O Evangelho, em concordância com os pressupostos espíritas – O Espiritismo, o que levará, incondicionalmente, a humanidade para uma Nova Era de paz e harmonia, por estar solvido o conflito entre Ciência e Religião.


Notas

[1] Ver entrevista de Adair Ribeiro Júnior para o Blog de Bruno Tavares. Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=TF_ZKMizXCo&t=1498s. Acesso em: 14 abr. 2024.

[2] Pierre-Paul Didier (1800-1865) foi editor e diretor da Livraria Didier, espírita e amigo de Allan Kardec, membro da Sociedade Parisiense de Estudos Espíritas. Editor as primeiras obras fundamentais do Espiritismo. Disponível em: https://www.luzespirita.org.br/index.php?lisPage=enciclopedia&item=Pierre-Paul%20Didier. Acesso em: 21 abr. 2024.

[3] Manuscrito do acervo do Projeto Allan Kardec, da Universidade Federal de Juiz de Fora, Documento número #217.

[4] A exemplo dos livros Imitação de Cristo e A Imitação da Bem-aventurada Virgem Maria, escritos no século XV pelo monge alemão Tomás de Kempis, que pregava uma vivência religiosa nos moldes de humildade e comunhão de Jesus de Nazaré, muito popular no meio católico. O primeiro foi traduzido para o francês por Lamennais, padre, filósofo, escritor e político francês, que contribuiu em Espírito nas obras fundamentais do Espiritismo. Maiores informações no Portal Luz Espírita. Disponível em: https://www.luzespirita.org.br/index.php?lisPage=enciclopedia&item=Lamennais. Acesso em: 16 abr. 2024.

[5] Une imitation de cris d'animaux. 2. Action de prendre quelqu'un pour modèle : Imitation d'un maître.

[6] Une conformité à quelque chose ; conformément à : J'ai agi selon vos désirs.


Referências

CAVALLARI, Marcelo Mursa. Os evangelhos: uma tradução. Cotia, SP: Ateliê Editorial; Araçoiaba da Serra, SP: Mnēma, 2020.

[COMUNICAÇÃO/DIÁLOGO], 1865. Disponível em: http://projetokardec.ufjf.br/item-pt/?id=217. Acesso em: 15 abr. 2024. Projeto Allan Kardec.

IMITATION. In: Dictionnaires français Larousse. Disponível em: https://www.larousse.fr/dictionnaires/francais/imitation/41662. Acesso em: 20 abr. 2024.

KARDEC, Allan. Imitação do evangelho segundo o espiritismo. Tradução de Evandro Noleto Bezerra. Brasília: FEB, 2014.

KARDEC, Allan. O que é o espiritismo. Rio de Janeiro: Federação Espírita Brasileira, 2011.

KARDEC, Allan. O livro dos espíritos. 33. ed. São Paulo: LAKE, 1974.

OLIVA NETO, João Angelo. Prefácio. In: CAVALLARI, Marcelo Mursa. Os evangelhos: uma tradução. Cotia, SP: Ateliê Editorial; Araçoiaba da Serra, SP: Mnēma, 2020.

SELON. In: Dictionnaires français Larousse. Disponível em: https://www.larousse.fr/dictionnaires/francais/selon/71921. Acesso em: 20 abr. 2024.


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Lembrando que a obra O Evangelho segundo o Espiritismo de Allan Kardec está disponível livremente disponível para download na nossa Sala de Leitura.


Veja aqui os artigos anteriores da série especial 160 anos do lançamento de O Evangelho segundo o Espiritismo.
Continue conosco e acompanhe os próximos artigos da série.

quinta-feira, 25 de abril de 2024

Cinquentenário da Folha Espírita


Reproduzimos aqui a matéria especial comemorativa pelo quinquagésimo aniversário de um dos mais importantes veículos de imprensa espírita, do Brasil e do mundo, a Folha Espírita, fundada em 1974 pelo casal Marlene & Freitas Nobre, por inspiração do médium Chico Xavier. O periódico está ativo até hoje, firme e forte na divulgação do Espiritismo. Esta reprodução é aqui em tom de homenagem a todos que fizeram e àqueles que ainda fazem acontecer este jornal, que muito honra a obra de Allan Kardec e dos Espíritos missionários da Terceira Revelação divina à humanidade terrena.

Foto: Carlos Souza – Da esq. para dir., Fábio Gandolfo Severino, Marcelo Nobre, Cláudia Santos, Conrado Santos e Walther Graciano Jr. exibem o selo postal personalizado e Renato Rosa, o livro comemorativo


São Paulo, 22 de abril de 2024 – Representantes do Movimento Espírita paulista estiveram reunidos no último sábado no Chico Xavier – Centro de Estudos Espíritas de São Paulo, no bairro da Lapa, na capital paulista, para comemorar os 50 anos da Folha Espírita, uma das publicações segmentadas mais importantes do País. Inspirado pelo médium Chico Xavier e concebido pelo jornalista Freitas Nobre, o jornal teve sua primeira edição publicada em 1974, em 18 de abril, o mesmo dia do lançamento de O Livro dos Espíritos, de Allan Kardec. Diversas lideranças do Movimento Espírita do Estado estiveram presentes ao encontro, entre as quais destacamos: Walther Graciano Júnior, presidente do Centro Espírita Cairbar Schutel, casa-berço da Folha Espírita situada no bairro do Jabaquara; Ricardo Silva Pastori, presidente do Grupo Espírita Batuíra, de Perdizes, cujo fundador, Spártaco Guilardi, esteve presente na criação da Folha Espírita; Ney Prieto Peres, que vivenciou o momento histórico há 50 anos; Paulo César Pio, representando o Centro Espírita Perseverança, da Vila Invernada, fundado por Guiomar de Oliveira Albanesi e seu esposo Serafim Antônio Albanesi; Ronaldo Zucatelli, presidente da União Fraternal Discípulos de Jesus; Marina Gazzoni, representando a Aliança Espírita Evangélica; Marcus Renato Ribeiro, presidente da Associação Médico-Espírita de São Paulo, que também representou a Associação Médico-Espírita do Brasil; e Oceano Vieira de Melo, representando a casa anfitriã.

Lideranças espíritas e colaboradores da Folha Espírita comemoram cinquentenário

O evento foi aberto pela jornalista Cláudia Santos, editora da Folha Espírita. Em parceria com Eleni Gritzapis, responsável pelo podcast da FE, Cláudia é uma das organizadoras do livro Folha Espírita, uma história de amor e dedicação à Doutrina Espírita, comemorativo ao cinquentenário do jornal, que teve a edição do diretor de Marketing da FE, Conrado Santos, e foi lançado no evento. A obra traz uma coleção das principais capas da FE ao longo desses 50 anos e está à venda no portal da FE.


Oceano Vieira de Melo, que está à frente do trabalho doutrinário, da programação de palestras, arte e cultura no Chico Xavier – Centro de Estudos Espíritas de São Paulo, abriu a celebração com a leitura de uma psicografia de Emmanuel, pelo médium Chico Xavier, de 1938, que informa que a espiritualidade divulgaria as ideias a partir de rádio, TV e jornais. Walther Graciano Júnior lembrou de seu envolvimento com a Folha Espírita e da responsabilidade do Grupo Espírita Cairbar Schutel com a divulgação da Doutrina pela FE e o advogado Marcelo Nobre, filho do casal Freitas Nobre e Marlene Nobre, da alegria do médium Chico Xavier ao ver a Folha Espírita nas mãos dos pais. “Esta é uma singela homenagem como imagino que foi o lançamento de O Livro dos Espíritos, há 167 anos”, declarou Fábio Gandolfo Severino, filho do professor Paulo Rossi Severino, responsável por uma das obras mais importantes da Editora FE, A Vida Triunfa. Os colunistas Waldenir Cuin e Sandra Marinho, que há 37 e 15 anos, respectivamente, escrevem para a Folha Espírita, trouxeram depoimentos de suas participações em todos esses anos no jornal e Conrado Santos, diretor de Marketing da Folha Espírita, contou que, em comemoração aos 50 anos da Folha Espírita, foi lançado um novo portal, que traz catálogo de livros com e-books e impressos, podcasts, edições do jornal online e acervo com as 600 edições do jornal para consulta. Como não há mais as assinaturas, segundo ele, também está sendo promovida a campanha Amigo da Folha Espírita, pela qual é possível escolher valores para se contribuir com a divulgação da Doutrina.


Selo registra história de um dos principais jornais da imprensa espírita

Renato Rosa, dos Correios, entrega o selo a Marcelo Nobre

Selo e carimbo personalizados. Cláudia Santos e Fábio Gandolfo Severino usam o carimbo alusivo aos 50 anos da FE, também feito para a comemoração

Renato Rosa, superintendente estadual de São Paulo Metropolitana dos Correios, encerrou a tarde do sábado com o lançamento de um selo postal personalizado desenvolvido especialmente para os 50 anos da FE. “Estamos muito felizes em estar aqui celebrando o cinquentenário de um jornal espírita, o que demonstra a liberdade religiosa que o Brasil vive”, declarou.


Inspirada pelo médium Chico Xavier,
Folha Espírita comemora 50 anos

Médium Chico Xavier (centro) foi o grande inspirador do casal Freitas Nobre e Marlene Nobre no trabalho de divulgação da Doutrina Espírita

Do papel, vendida em banca e para assinantes, nos formatos standard e tabloide, chegando ao digital e se expandindo para as redes sociais e podcast, com versão a partir deste mês também em inglês, veículo segue fazendo história com o propósito de discutir fatos da atualidade à luz da Doutrina Espírita, codificada por Allan Kardec.

“Com o propósito de ser o veículo de divulgação das atividades espíritas em nosso país, sintetizando também os acontecimentos internacionais que interessam à Doutrina ou dando a interpretação para os fatos diversos com a projeção explicativa do Espiritismo à história contemporânea”, nascia em 18 de abril de 1974 a Folha Espírita.

Em meados de 1973, Jamil Nagib Salomão visitou Chico Xavier, em Uberaba/MG, e voltou como portador de um recado do médium ao então deputado federal espírita José de Freitas Nobre. Este teria a responsabilidade de lançar um jornal espírita para venda em bancas e deveria ter o apoio do Grupo Espírita Cairbar Schutel, de Diadema/SP, com atividades também no bairro do Jabaquara, na capital paulista.

Atendendo à convocação espiritual, foi publicado, em 18 de abril de 1974, o primeiro número da Folha Espírita. Em 50 anos ininterruptos de atividades, foram vários os momentos históricos vividos e liderados pelo jornal, como a campanha do Prêmio Nobel para Chico Xavier, a ação contra o aborto em nível nacional e o trabalho em conjunto com a Associação Médico-Espírita de São Paulo na realização de uma pesquisa científica sobre a mediunidade de Francisco Cândido Xavier, que durou mais de 15 anos e teve repercussão internacional, auxiliando ainda em roteiros para programas de televisão e de cinema. A publicação de livros teve início em 1990, e alguns deles são referências para estudo nas casas espíritas de todo país e no exterior.

“Em todos estes anos, a Folha Espírita tem procurado ser intérprete dos valores de seu tempo, conforme já esclarecia seu fundador na primeira edição. Jamais procurou impor convicções, tampouco ser a dona da verdade, buscando apenas contribuir para a divulgação da Doutrina Espírita. Aprendemos com Freitas Nobre a respeitar o direito de opinião, de divergência, porque a permuta de experiência enriquece o pensamento e desenvolve o discernimento. E nesse princípio nos mantemos”, afirma a editora Cláudia Santos.

Folha Espírita sofreu as transformações pelas quais passou a mídia mundial. Quando era mensal, era custeada pela venda em bancas e, principalmente, por assinantes. Em 2020, na pandemia, entrou definitivamente no modo on-line, ganhou as redes sociais (FB, Instagram e YouTube) e, em 2022, aderiu aos podcasts. “Temos uma equipe composta por jornalistas e outros profissionais da área de Comunicação que trabalha diariamente para levar o melhor conteúdo ao público espírita e não espírita e que está em festa pela alegria do dever cumprido até aqui, unida no ideal desde o princípio, com a certeza de que faz parte da história do Movimento Espírita brasileiro”, completa Cláudia.

“Não desejamos firmar posições dogmáticas, mesmo porque a Doutrina Espírita é a doutrina da razão, do raciocínio, da convicção, e é preferível, como dizia Kardec, rejeitar cem verdades que admitir uma mentira. Mas em questão de fidelidade doutrinária, não podemos tergiversar, porque a Codificação de Kardec traçou, com a assistência do mundo espiritual, os rumos filosóficos, científicos e religiosos do Espiritismo. Por isso mesmo, a redação se responsabiliza pelos conceitos emitidos pelos seus colaboradores quanto à orientação doutrinária, mesmo porque a matéria não seria divulgada se não estivesse fiel aos princípios kardequianos”, escreveu Freitas Nobre (foto) na primeira edição.


Em 50 anos ininterruptos de atividades, destacamos momentos históricos, como a campanha do Prêmio Nobel para Chico Xavier, a ação contra o aborto em nível nacional e o trabalho com a Associação Médico-Espírita de São Paulo na realização de uma pesquisa científica sobre a mediunidade de Chico Xavier


Data remete ao lançamento de O livro dos Espíritos


A data de lançamento foi escolhida exatamente por ser a data histórica do lançamento de O livro dos Espíritos, de Allan Kardec. A direção da Folha Espírita, objetivando homenagear a Federação Espírita do Estado de São Paulo, fez o lançamento do jornal na sede da Livraria Espírita, à Rua Maria Paula, 198. Estiveram presentes, entre outros, Luiz Monteiro de Barros, então presidente da União das Sociedades Espíritas do Estado de São Paulo, e representando o presidente da Federação Espírita do Estado de São Paulo, Carlos Jordão da Silva; Antônio Ferreira Filho, presidente da Associação Médico-Espírita do Estado de São Paulo; Spartaco e Zita Ghilardi e Apolo Oliva Filho, do Grupo Espírita Batuíra; Pedro Jacintho, diretor de Divulgação da FEESP; Josyan Courté, diretor do Departamento do Livro e administrador da Livraria Espírita; S. Ramaciotti, do Grupo Espírita Emanuel, de São Bernardo do Campo/SP; Manoel Pricoll, conselheiro da FEESP; Edson Leones, diretor da área de Ensino da FEESP; Ciro Dirani, diretor da Escola de Aprendizes do Evangelho; Manoel São Marcos, diretor da Escola de Médiuns; João Batista Lausto, diretor de Relações Públicas da FEESP; Inácio Giovini, diretor do Departamento de Organização da USE; Francisco Galvez e Encarnação Galvez, Flora Geni, Stig Roland Ibsen e representantes de numerosas entidades espíritas do estado de São Paulo.

“Foi uma noite de profunda alegria. Foram expostos os planos do jornal e rememorados os fatos principais da vida de Allan Kardec relacionados com a divulgação doutrinária e, particularmente, com o lançamento de O livro dos Espíritos. O comentário predominante na cerimônia de lançamento do jornal era a sensação de cada um dos confrades em poder encontrar nas bancas de jornais da cidade a Folha Espírita, base para a estruturação de um semanário e, afinal, um diário Espírita para o Brasil”, relembra Cláudia.


Colaboradores que fizeram história

Foram vários os nomes que em todos esses anos escreveram na Folha Espírita. Dentre eles, Hernani Guimarães Andrade, que esteve à frente da seção “Espiritismo e Ciência”; Elsie Dubugras, que escrevia sobre inúmeros temas, principalmente os ligados a fenômenos paranormais do exterior; Fernando Worm, que realizou muitas das entrevistas com Chico Xavier e escreveu muito sobre os aprendizados com o médium; e Richard Simonetti, sobre temas doutrinários e atualidades sob o enfoque da Doutrina, quase sempre com um toque de humor. Colaboraram ainda: Zilda Rossin, Hermínio C. Miranda, Jorge Andréa, Márcia Bacelli, Mario B. Tamasia, Ney Prieto Peres, Carlos A. Bacelli, Walter Francini, Fernando Portela, Miriam Portela, Marco Antonio Palmieri, Suely Abujade, Anna Graciano, Alba das Graças Pereira, Sebastião Anselmo, Geraldo Santos, Sonia Rinaldi, Leila Villas, Leandro Romani, Cristiane Assis, entre tantos outros.


O futuro

Desde outubro de 2020, a Folha Espírita passou a ser totalmente digital e pode ser acessada pelo site www.folhaespirita.com.br. Foi também nessa época que passou a ser gratuita, ou seja, não precisa mais ser assinante para ter acesso às publicações mensais. “É desta forma, honrando o compromisso com a divulgação que nos foi ensinado pelos fundadores, que prosseguimos produzindo conteúdo mensalmente. Além da edição mensal on-line gratuita, para os 50 anos lançamos o nosso novo portal, que conta também com um acervo de todas as edições para que todos possam pesquisar e estudar a história da Folha Espírita”, reforça o diretor de Marketing Conrado Santos, que, desde a infância, está envolvido com o trabalho da FE.

E seguindo na direção da digitalização, a Folha Espírita lançou em 2020 seu podcast, que está disponível em diversas plataformas de áudio e em seu portal, possibilitando, assim, o acesso a reflexões atuais sob a ótica da Folha Espírita. “A versão podcast nasceu em meio à pandemia, com o objetivo de trazer novos formatos em um momento tão único que a humanidade atravessou, ao mesmo tempo em que nos mantemos atuais nas tendências de comunicação do mundo contemporâneo”, comenta Eleni Gritzapis, editora do canal. O compromisso é por mais 50 anos e muito mais divulgando a Doutrina.


FE em livros

Acompanhado da Folha Espírita nasceu também a FE Editora, com o primeiro livro, A vida triunfa, em 1990. Com mais de 100 mil exemplares de títulos vendidos, a editora, liderada pela esposa de Freitas Nobre, Marlene Nobre, que também esteve à frente do jornal após o desencarne do companheiro, foi responsável pela assinatura de vários títulos, como Lições de sabedoria; A obsessão e suas máscaras; O clamor da vida; A vida contra o aborto; Nossa vida no além; A alma da matéria; O passe como cura magnética; O dom da mediunidade; A luz do eterno recomeço; 2012 – a data limite do Velho Mundo; 2019 – o ápice da transição planetária. Um dos maiores nomes do Movimento Espírita do país, que desencarnou em janeiro de 2015, Marlene Nobre, foi a fundadora das associações médico-espíritas do Brasil e Internacional.


quarta-feira, 24 de abril de 2024

160 anos "O Evangelho segundo o Espiritismo", por Dora Carvalho



Prosseguindo com a nossa série pelos 160 anos do lançamento de O Evangelho segundo o Espiritismo de Allan Kardec, trazemos a participação de mais uma admirável divulgadora do Espiritismo, colaboradora ativa da Luz Espírita, Dora Carvalho, direto de Recife - PE.

Nossa amiga então discorre sobre os fundamentos da obra, isto é, a essência da mensagem contida no livro, que é, em suma, a essência evangélica-cristã.

Confira abaixo!


A essência evangélica-cristã
Dora Carvalho



O Evangelho segundo o Espiritismo é a terceira obra da Codificação Espírita e quarto livro editado por Allan Kardec após a adição de seu pseudônimo.

Impresso pela primeira vez em abril de 1864, na França, completa 160 anos de lançamento em 15 de abril de 2024. Em síntese, Kardec a apresenta como “a explicação das máximas morais do Cristo em concordância com o Espiritismo e suas aplicações às diversas circunstâncias da vida”, refletindo a essência evangélica-cristã de suas páginas.

O Evangelho Segundo o Espiritismo tem considerável influência, não somente para o mundo religioso, que nele encontra as máximas que lhe são necessárias, como também a vida prática das nações que podem nele haurir instruções excelentes.  Com vinte e oito capítulos da mais excelsa moral, podemos dizer que feliz é o homem que, diante das dificuldades e peripécias da existência, tenha nas mãos e sob os olhos os luminosos textos dessa obra consoladora. Esse livro é um hífen de luz entre a filosofia e a ciência espíritas.

Nele se encontra a verdadeira doutrina ensinada pelo Cristo.

O Evangelho segundo o Espiritismo foi publicado, inicialmente, com o título de Imitação do Evangelho. Kardec explica o seguinte: “Mais tarde, por força das observações reiteradas do Sr. Didier e de outras pessoas, mudei-o para Evangelho Segundo o Espiritismo. Trata-se do desenvolvimento dos tópicos religiosos de O Livro dos Espíritos, e representa um manual de aplicação moral do Espiritismo.

Em comunicação a Kardec, a 14 de setembro de 1863, declaravam os Guias de Kardec: “Nossa ação, principalmente a do Espírito da Verdade, é constante ao teu redor, e de tal maneira, que não a podes negar. Assim, não entrarei em detalhes desnecessários, sobre plano da tua obra, que, segundo os meus conselhos ocultos, modificaste tão ampla e completamente”. E logo adiante acentuavam: “Com esta obra, o edifício começa a libertar-se dos andaimes, e já podemos ver-lhe a cúpula a desenhar-se no horizonte”.

Mas foi em 1866, em sua terceira edição, que ficou definida e conhecida a estrutura atual do livro. Sempre com o auxílio e sugestão da espiritualidade, Kardec modificou as duas primeiras edições, suprimindo textos, acrescentando outros, alterando a redação de vários parágrafos e do próprio título. A primeira edição da obra foi publicada com o nome “Imitação do Evangelho Segundo o Espiritismo”

Composto por 28 capítulos com passagens evangélicas seguidas de instruções dos espíritos, a obra é dividida em cinco partes: os atos ordinários da vida de Jesus, os milagres, as predições, as palavras que serviram de base aos dogmas e os ensinamentos morais. Sendo finalizada com uma coletânea de preces espíritas para o fortalecimento da alma nos distintos momentos da vivência terrestre.

Encontramos, no prefácio do livro, a instrução transmitida pelo Espírito da Verdade, na qual ele anuncia que são chegados os tempos em que todas as coisas devem ser restabelecidas no seu verdadeiro sentido, para dissipar as trevas, confundir os orgulhosos e glorificar os justos, além de convidar os homens a se unirem para fazer a vontade do Pai. Em nota, Allan Kardec afirma que esse é o objetivo do Evangelho segundo o Espiritismo e, também, o verdadeiro caráter do próprio Espiritismo.

É no Evangelho segundo o Espiritismo, em seu capítulo 17 – item 4, que o verdadeiro espírita é caracterizado.  É aquele que busca se transformar porque conhece a sua realidade espiritual e consegue compreender as consequências de seus atos diante de um contexto natural regulado pelas leis divinas.

Conforme afirma Kardec, os princípios doutrinários lhe fazem vibrar as fibras que nos outros permanecem mudas; em uma palavra: foi tocado no coração, e por isso a sua fé é inabalável. Assim, o verdadeiro espírita busca se transformar porque conhece a sua realidade espiritual e consegue compreender as consequências de seus atos diante de um contexto natural regulado pelas leis divinas.

Em seus vinte e oito capítulos, encontramos no Evangelho segundo o Espiritismo a orientação ética e moral para o maior objetivo do ser humano: a própria evolução espiritual. O desvendar da realidade do ser e sua relação com o Criador, de suas potencialidades individuais e de suas responsabilidades perante si e para com o próximo é de um valor inestimável, que não somente responde as questões existenciais que sempre angustiaram o homem (quem somos, de onde viemos e para onde estamos indo?), assim como oferece um roteiro seguro sobre o que devemos fazer para alcançar a tão sonhada felicidade, pelo amor e pela instrução.

Dando especial ênfase aos ditos e aos feitos do Senhor Jesus, o que quer dizer ao ensino moral, erige-se como regra de conduta, que abraça todas as circunstâncias da vida, particular ou pública, o princípio de todas as relações sociais, baseadas na mais rigorosa justiça. Enfim, é a rota infalível da felicidade futura.

Essa obra é para uso de todos. Cada um pode aí colher os meios de conformar sua conduta à moral do Cristo, nosso Modelo e Guia. Os espíritas aí encontram as aplicações que mais especialmente lhes concernem. As instruções dos Espíritos, as vozes do céu, que vêm esclarecer os homens e os convidar à imitação do Evangelho.

Nele encontram as almas aflitas o consolo e a explicação para as suas dores, o sermão das bem-aventuranças ganha um novo e especial colorido, sob a meridiana luz do esclarecimento espírita. Parece-nos ouvir de novo a voz do Suave Pastor: “Vinde a mim vós que estais sobrecarregados e aflitos, e eu vos aliviarei...”

Os versos de rara poesia das aves do céu, dos lírios do campo que não semeiam, nem fiam... Toda a beleza das palavras de Jesus numa linguagem acessível, inteligível. Explicado de forma racional porque fé inabalável só o é a que pode encarar frente a frente a razão, em todas as épocas da Humanidade.

É nele também que se encontram explicadas as promessas do Cristo, na célebre noite da derradeira ceia com os Apóstolos, acerca do Consolador que viria depois. O Consolador Prometido, que viria quando o mundo estivesse maduro para o compreender; Consolador que o Pai enviaria para ensinar todas as coisas e para relembrar o que o Cristo havia dito.

E o Espiritismo vem, na época predita, cumprir a promessa do Cristo. Preside ao Seu advento o Espírito de Verdade. Ele chama os homens à observância da Lei: ensina todas as coisas, fazendo compreender o que Jesus só disse por parábolas. Vem abrir os olhos e os ouvidos, porquanto fala sem figuras, nem alegorias. Vem, enfim, trazer a consolação suprema aos deserdados da Terra e a todos os que sofrem, atribuindo causa justa e fim útil a todas as dores.

Jesus, que nunca se apartara dos homens, aproxima-Se ainda mais e volta a falar como outrora, chamando e conduzindo. A Boa Nova é o roteiro e a mensagem espírita o consolo. À medida que o entendimento humano progride na direção desse conhecimento, encontramos mais sentido nas Suas lições e exemplos. Embora nada tenha escrito, Seus discípulos, para não perderem Seus ensinamentos passaram a registrar Seus ditos e Seus feitos.

O Evangelho segundo o Espiritismo vem corporificar no mundo a palavra imperecível de Jesus, o excelso enviado do Pai. É Ele mesmo de retorno, tomando os filhos e as filhas da dor nos Seus braços para os conduzir para a luz gloriosa da verdade. O Evangelho não é um livro simplesmente. É um templo de ideias infinitas.  Miraculosa escola das almas estabelecendo a nova Humanidade.

O Evangelho segundo o Espiritismo surge como Divina luz, iluminando a Terra e lecionando o findar das guerras, implantando a paz. É a suprema força, que ergue o doente, que se alegra ao sentir as energias renovadas. É o roteiro amigo, que mostra o caminho, muitas vezes áspero, mas que nos conduz no rumo da felicidade autêntica... Essa preciosa obra acorda os homens que não creem na vida, que vivem na lida terrena, sem maiores objetivos... É um ninho de amor que aconchega a alma. É o despertador, que acorda o ser, e o faz compreender sua verdadeira finalidade no planeta azul.

Bendito seja o Evangelho de Jesus!


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Lembrando que a obra O Evangelho segundo o Espiritismo de Allan Kardec está disponível livremente disponível para download na nossa Sala de Leitura.


Veja aqui os artigos anteriores da série especial 160 anos do lançamento de O Evangelho segundo o Espiritismo.
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segunda-feira, 22 de abril de 2024

160 anos "O Evangelho segundo o Espiritismo", por Carlos Seth Bastos



Dando seguimento à nossa série sobre os 160 anos do lançamento de O Evangelho segundo o Espiritismo de Allan Kardec, o artigo da vez é o do nosso confrade Sir CSI, Carlos Seth Bastos (Jacareí - SP), grande pesquisador espírita, autor de importantes livros historiográficos para a nossa doutrina e diretor da fanpage CSI - Imagens e registros históricos do Espiritismo no Facebook, que já é uma referência em matéria de História Espírita.

Para começar, ele levanta uma questão bastante relevante: a imprecisão do dia exato do lançamento da obra que estamos destacando nesta série de artigos, mas o enfoque principal é outro, de ordem filosófica. Pois é! O nosso amigo não tem apenas "história" pra contar; ele é multiversado! Por isso, vale a pena conferir o texto dele, que ofertamos a seguir:


Ética teórica e prática moral do espiritismo

Carlos Seth Bastos

O movimento espírita adotou o dia 15 de abril de 1864 como a data de lançamento da Imitação do Evangelho segundo o Espiritismo, obra que precedeu a versão definitiva de O Evangelho segundo o Espiritismo.

Não sabemos de onde surgiu esta data, pois a Declaração do Impressor é do dia 8 de janeiro de 1864. A Revista Espírita de abril, normalmente publicada no início do mês, anunciou que a obra já estava à venda. Tal informação foi corroborada pelo jornal La Presse do dia 11, que anunciou que o título estava publicado desde a semana anterior, que se iniciou no dia 3. Em uma carta ao Sr. Edoux, do dia 15, publicada pela Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF), Allan Kardec informou que tinha enviado um certo número de exemplares a Lyon no dia 14, e que alguns descuidos do impressor exigiram a reimpressão de certas partes, o que havia causado uma demora imprevista para o lançamento da obra. O registro da obra no jornal Bibliographie de la France, que normalmente acontece dias depois do Depósito Legal, foi feito no dia 16. Finalmente, o Novo Dicionário Universal de Lachâtre mencionou apenas abril.

Fonte: La Presse de 11 de abril de 1864.

Não vamos nos deter aqui em outros aspectos históricos, como os primeiros títulos pensados por Kardec durante o projeto do livro (As vozes do céu e As vozes do mundo invisível) [1], plano que ele já acalentava desde antes do início de 1862 [2], e que foi totalmente reestruturado para a obra Imitação, depois “revista, corrigida e modificada” com alterações importantes na edição definitiva de O Evangelho de 1866.

Também não desenvolveremos a questão da identificação dos médiuns e Espíritos utilizados, nos limitando a informar que contamos 14 prováveis médiuns [3], cerca de 47 Espíritos e 14 localidades diferentes.

Destacamos apenas que na mesma época em que o pintor Claude Monet esteve em Sainte Adresse, comuna da Normandia, no Norte da França, Kardec esteve lá preparando O Evangelho, o qual terminaria depois da sua volta ao lar, na Villa de Ségur. Na UFJF estão disponíveis muitas das cartas trocadas com a esposa, Amélie Boudet, durante o período, já que ela o acompanhou apenas no início da viagem.

Kardec era um homem racional e religioso, assim como Kepler, Newton, Pasteur etc. Muitas vezes suas preces ao D. T. P. ou ao S. D. T. P. (Senhor Deus Todo Poderoso) foram registradas por ele em manuscritos, apenas alguns já disponibilizados pela Fundação Espírita André Luiz (FEAL) na página da UFJF.

O fato do método da Concordância Universal do Ensino dos Espíritos (CUEE) estar na Introdução de O Evangelho, ilustra esta característica, racional e religiosa, do antigo mestre de pensionato, mas também não será nosso objeto de reflexão aqui [4].

Então, para homenagear os 160 anos da publicação de O Evangelho segundo o Espiritismo, ainda com o título anterior de Imitação, procuraremos fazer uma brevíssima análise em relação à ética teórica e à prática moral do espiritismo comparadas ao empirismo britânico, ao idealismo alemão, ao utilitarismo moral e ao existencialismo ateísta, através dos respectivos representantes, Allan Kardec (1804-1869), Thomas Hobbes (1588-1679), Immanuel Kant (1724-1804), John Stuart Mill (1806-1873) e Jean Paul Sartre (1905-1980), deixando obviamente inúmeros outros grandes pensadores de fora.

Para mostrar de forma simples um assunto complexo, usamos outro método aplicado por Kardec: o de perguntas e respostas. É claro que tal comparação é por demais reducionista, e serve apenas para ilustrar timidamente algumas nuances destes movimentos e filosofias.

Quais seriam as palavras-chaves para identificá-los?

Para o espiritismo, a parte moral poderia se resumir à lei natural de amor, justiça e caridade. Para o empirismo de Hobbes, que tem como objeto principal a política, mas que também desenvolveu pensamentos sobre a moral, seria o contrato social, que garantiria a ordem. O imperativo categórico ou a lei moral universal seriam um dos pilares do idealismo de Kant, que para o utilitarismo de Mill seria a maximização da felicidade. As palavras-chave para o existencialismo de Sartre talvez sejam a liberdade radical com responsabilidade autêntica, sem má fé.

Em relação à autonomia moral, quais seriam as visões destes pensadores?

No espiritismo, as leis de Deus estão inscritas na própria consciência e cada um tem a liberdade de seguir ou não essas leis, arcando com as consequências.

Já para Hobbes, os indivíduos cedem parte da sua liberdade em troca da segurança e da ordem proporcionada pelo Estado, portanto a moral deriva de um contrato social, de leis e normas estabelecidas pelo Estado.

Para Kant, o fundamental é a liberdade individual de tomar decisões éticas segundo a própria consciência. Em outras palavras, a moral é determinada pela própria razão humana. Ao tomar uma decisão, devemos nos perguntar se a máxima por trás da nossa ação poderia se tornar uma lei moral para todos. Se a máxima não puder ser universalizada sem gerar contradições ou injustiças, então ela é moralmente inaceitável.

A liberdade individual também é um valor fundamental para Mill, mas a melhor ação é aquela que produz o maior bem para o maior número de pessoas, portanto a autonomia é limitada pelos direitos e pelo bem-estar da maioria da sociedade.

Por outro lado, Sartre acreditava que fôssemos livres para escolher nosso destino, sem maiores consequências, a não ser a própria autoafirmação e a realização individual, embora fôssemos também responsáveis pelas nossas escolhas. Ao culpar fatores externos ou mesmo a natureza humana, estaríamos agindo de má fé.

Quais seriam então as consequências das más ações?

Para Sartre seriam o remorso, a raiva, o isolamento, o prejuízo à reputação etc. Da mesma forma Kant, que diria ser o remorso, a culpa, a insatisfação consigo mesmo, independentemente de possíveis consequências externas. Do outro lado teríamos Mill, que falaria do prejuízo ao bem-estar da sociedade, e Hobbes, que mencionaria o caos, a desordem, a violência, a criminalidade, a instabilidade política, o declínio do bem-estar social.

Kardec complementou Kant e não se deteve nos limites de Mill, apresentando a imortalidade e a reencarnação com possíveis repercussões da vida presente.

Que controles poderiam ser exercidos em relação às más ações?

O empirismo de Hobbes e o utilitarismo de Mill apresentam respectivamente soluções parecidas: punição pelo soberano, combinado com educação e promoção de valores morais; ou leis criadas por um governo democrático que represente os interesses da maioria da população.

De outro lado, Kant e Sartre mencionam que deveríamos apenas agir com prudência para encontrar soluções para situações específicas, moralmente inaceitáveis; e agir com a própria consciência.

Kardec, por sua vez, nos fala de leis naturais e leis humanas.

Particularmente não cremos em recompensas e punições emitidas diretamente do próprio Deus, mas sim em consequências felizes ou infelizes das nossas ações, que podem ecoar por várias encarnações, e que são regidas por leis naturais estabelecidas por Deus. O processo de reencarnação deve ser natural, às vezes iniciado pelo cansaço de sofrer. Entendemos reencarnações felizes ou infelizes, de provas ou expiações, como escolhas de cada Espírito, mas ignoramos o processo de implementação destas escolhas. Podemos imaginar algum tipo de automatismo e ainda uma organização social, mas temos dificuldades em compreender qualquer milícia coercitiva na dimensão espiritual impondo reencarnações expiatórias para Espíritos mais rebeldes. Se há compulsoriedade, também desconhecemos o processo de execução.

De qualquer forma, a reencarnação deve ser obrigatória para todos os Espíritos que ainda não tenham atingido a perfeição. Não precisamos adulterar o pensamento de Allan Kardec para alinhá-lo a tais crenças pessoais ou a outras filosofias, que obviamente tem vários pontos de contato com o próprio espiritismo. Tampouco precisamos trazer os conceitos destes outros pensadores para o espiritismo, a não ser para a saudável comparação, se tivermos tempo suficiente de estudar Kardec e os demais.

Em O Evangelho segundo o Espiritismo, bem como em outras obras de Kardec, encontramos dezenas de menções a punições, penas, castigos, gozos e recompensas. Sempre as interpretamos como dores e sofrimentos provocados por nós mesmos, como consequências da violação das leis naturais, da mesma forma que a lei da gravidade nos pune se jogarmos uma pedra para o alto e ela cair na nossa cabeça. Um processo obsessivo, por exemplo, não nos seria imposto, mas seria consequência de como nossas ações foram recebidas por aqueles que prejudicamos.

Deus deve ter nos criado, bem como suas leis naturais. Nós criamos nossas leis para viver em sociedade. Se não as seguir, seremos punidos com o seu rigor. Se não formos pegos pelas leis humanas, e nos sentirmos culpados, seremos punidos pelas leis divinas, através da própria consciência ou externamente, através da repercussão que nossas ações tenham causado em outros.

O livro publicado há 160 anos por Kardec nos ajuda a refletir sobre a melhor conduta, optando por seguir as leis de Deus e sermos felizes, ou não!

Poder-se-ia argumentar: por que não O Alcorão segundo o Espiritismo; O Pentateuco segundo o Espiritismo; Confúcio e Mêncio segundo o Espiritismo; etc., etc., etc.? Camille Debans, crítico do espiritismo, fez exatamente isso em Discours contre le spiritisme par um medium incredule. Mas na França do século XIX, bem como no Brasil dos séculos XX e XXI, a compreensão destas leis, que são universais, explicadas pelo espiritismo, tiveram mais apelo entre os católicos, assim como o tiveram entre os protestantes nos países anglo-saxões.

Retiremos pois de O Evangelho segundo o Espiritismo, a essência da ética que permeia todas as religiões, a regra de ouro ou da reciprocidade [5], e tentemos aplicá-la nos mínimos detalhes da nossa vida cotidiana. Parece simples, mas a todo momento percebemos quão longe estamos desta meta: a impaciência no lar, a ausência de respeito de vizinhos barulhentos, a falta de gentileza no trânsito, o relacionamento abusivo no trabalho, a carência de boa vontade entre trabalhadores da casa espírita, a arrogância e o pouco tempo para ouvir e aconselhar.

Sigamos pois, cada um, o nosso caminho! Saibamos comemorar os 160 anos de O Evangelho, com um pouco mais de ação.

Carlos Seth Bastos


Notas

[1] Com anúncios nas contracapas de obras publicadas por Kardec em 1862, como a 1ª edição de O Espiritismo na sua mais simples expressão e a 3ª edição de O que é o Espiritismo.

[2] Conforme deduz-se da carta de 10 de fevereiro de 1862 para o Sr. Sabo, disponível na página do Projeto Allan Kardec da UFJF.

[3] Grande parte está identificada na obra Espíritos sob investigação: resgatando parte da história.

[4] Reflexões sobre o tema estão no livro Espiritismo sob investigação: avaliando sua progressividade, bem como no bônus adicional “A esperança”, disponível em https://www.luzespirita.org.br/index.php?lisPage=livro&livroID=204; acesso em 13/04/2024.

[5] Hinduísmo: Esta é a suma do dever: não faças aos demais aquilo que, se a ti for feito, te causará dor. − Mahabharata 13, 113.8 | Budismo: Não atormentes o próximo com aquilo que te aflige. − O Buda, Udana-Varga 5, 18 | Confucionismo: Não façais aos outros aquilo que não quereis que vos façam. − Confúcio, As Analectas 15, 23 | Cristianismo: Portanto, tudo que quereis que os homens vos façam, fazei-o também a eles. − Jesus, Evangelho de São Mateus 7, 12 | Judaísmo: O que é odioso para ti, não o faças ao próximo. − Talmude, Shabbat 31ª | Islamismo: Nenhum de nós é crente até que deseje para seu irmão aquilo que deseja para si mesmo. − Sunnah (Sahih Muslim, Livro 1, Hádice Número 72) | Fé Baha’i: Não coloques em ninguém um fardo que não desejarias para ti, e não desejes a ninguém o que não desejarias para ti mesmo. − Baha’u’llah, Suriy-i-Muluk (44). Claro, não vale para o masoquista!!


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Lembrando que a obra O Evangelho segundo o Espiritismo de Allan Kardec está disponível livremente disponível para download na nossa Sala de Leitura.


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