terça-feira, 28 de setembro de 2021

Documentos inéditos desmentem suposta trama de Leymarie para adulteração dos livros de Kardec

Continuando as pesquisas acerca dos desdobramentos do movimento espírita logo após a desencarnação de Allan Kardec em 31 de março de 1869, a fanpage CSI do Espiritismo anunciou mais uma leva de documentos históricos inéditos que vêm ajudar a redesenhar a interpretação daquele cenário da nascente do Espiritismo; são cartas de personagens diretamente envolvidos em questões em voga nesse processo de compreensão da Historiografia da nossa doutrina, incluso Pierre-Gaëtan Leymarie (1827-1901) — que mais tarde viria a ser o principal responsável pela condição do legado do codificador espirita, cuja gestão seria bastante questionada. Esses documentos já estão sendo profundamente estudados, a fim de serem melhor contextualizados, mas num primeiro aspecto eles já podem referidos como mais uma substancial evidência para desmontar a recorrente tese de que os livros A Gênese, os Milagres e as Predições segundo o Espiritismo e O Céu e o Inferno, ambos de Kardec, teriam sido adulterados e que justamente Leymarie seria o mentor desse possível crime. Em suma, Leymarie estava afastado de Paris (onde se encontrava o núcleo espírita) e bastante ocupado para poder tramar a dita adulteração.

"O que Leymarie e Bittard estariam fazendo entre 1869 e 1870? Podemos assegurar que estavam bem longe da polêmica questão levantada atualmente sobre as últimas edições de A Gênese e de O céu e o inferno, atualizadas por Allan Kardec." — resume a postagem do CSI do Espiritismo, dirigida por Carlos Seth, que também trabalha em parceira com a fanpage AKOL, de responsabilidade de Adair Ribeiro, e o site Obras de Kardec, de Luciana Farias.

Saiba mais em O caso a Gênese.

Por indicação dos pesquisadores brasileiros, o nosso confrade francês Charles Kempf foi em busca e então teve acesso a uma série de documentos guardados na sede dos Arquivos Municipais de Paris, na França, documentos esses desconhecidos de nossa geração, mas que agora vêm à lume corroborar com a ideia já levantada sobre o envolvimento de Leymarie com campanhas políticas, exílios e, por conseguinte, seu afastamento temporário das atividades do movimento espírita. Leymarie havia sido membro e médium da Sociedade Parisiense de Estudos Espíritas (o centro espírita fundado em 1 de abril de 1858 por Allan Kardec), mas também era um ativista político que lutava em prol das ideias republicanas, pelo que foi expulso do seu país bem em seguida ao golpe de estado de 1851, em que Napoleão III se autoproclamou imperador francês; de retorno à pátria é que conheceu a nova doutrina, descobriu-se médium e se tornou espírita.

Saiba mais sobre Leymarie na Enciclopédia Espírita Online.

Lote de documentos dos Arquivos Municipais de Paris

O primeiro documento publicado pelos pesquisadores foi uma carta de Leymarie ao Sr. Prévost, de Cempuis (comuna situada ao Norte da França) que aqui transcrevemos a tradução de alguns fragmentos. A apresentação deste documento foi feita assim pelos pesquisadores:

"Havíamos prometido em pelo menos três ocasiões [1, p. 80] [2-3] nos aprofundar no período pós-desencarne de Kardec [a]. Analisemo-lo, em alguns aspectos, até o início da comuna de Paris [b]. Comentaremos agora a primeira de quatro cartas de Leymarie ao Sr. Prévost [c]. Apresentaremos apenas alguns fragmentos em tradução livre, a partir da transcrição feita pelo colega Charles Kempf. A propriedade dos manuscritos é dos Arquivos Municipais de Paris."

Agora, os trechos que mais nos interessa dessa carta:

"Paris, 18 de agosto de 1870

"Senhor Prévost,

"Compartilhamos as mesmas ideias, tanto para o espiritismo quanto para as ideias patrióticas (...)

"Amigo, que progressão para a queda [d], e desde o plebiscito [e], que lição - eles votaram como cegos e Deus nos pune a todos conjuntamente (...)

"Venho, pois, de Pimprez, onde reside a minha pequena família (...)

"Queria explicar-lhes que o imperador, pelo plebiscito, pediu o direito de comandar os exércitos de terra e mar, além do direito de fazer guerra e que, votando sim, lhe haviam concedido o seu pedido (...)

"Enquanto isso, os prussianos marcham sobre Paris e nosso exército está recuando. Grandes cidades como Metz se curvam a 4 homens e um cabo (...)

"Nesse ínterim, vejo com pesar todos aqueles que não são retidos pela idade e pela família, e pensando nesta França nervosa, irritável e orgulhosa em sua essência, recupero a confiança e saberemos como expulsar os despotismos da Prússia e ao mesmo tempo do Império (...)

"Espalhar a educação abundantemente, habituar o campo à vida política, é a grande obra daqui para a frente, temos que ir trabalhar com rigor, os Espíritos já nos disseram muitas vezes (...) os arquivos do Sr. Kardec estão cheios dessas comunicações.

"Se por medo da passagem de tropas você precisa de algumas pessoas enérgicas, por favor, considere-me. Já que não temos armas em Paris, posso ser de alguma utilidade para você.

"Sr. Guilbert escreveu-me esta manhã de Rouen (...)

"Fiz um trabalho muito longo para a Revista Espírita sobre a relação do homem com a vida animal e sobre a inteligência originária das espécies mais humildes, subindo de degrau em degrau até o homem e depois ir além dele para ir como um Espírito para a erraticidade [4].

"Adeus, Sr. Prevost, em nome de minha família, do Sr. Bittard e nossos amigos em comum (...)

"P. G. Leymarie."

Fotografia da carta de Leymarie ao Sr. Prevost

Sobre essa correspondência, o comentário dos pesquisadores é este:

"Leymarie era de fato um republicano, envolvido em temas políticos e disposto à luta pelas suas ideias. Ainda visitava Paris, embora já em meados de 1870 não vivesse lá, mas em Pimprez [g], a mais de 100 km da capital, e a aproximadamente à mesma distância de Cempuis, onde morava o Sr. Prévost. Estava também envolvido com educação [f], conhecia os arquivos de Kardec, bem como o Sr. Guilbert e o Sr. Bittard, fundadores da Sociedade Anônima [para a continuação das obras espíritas de Allan Kardec]. Estava longe da administração, mas submeteu uma série de artigos à Revista Espírita, publicados entre setembro de 1870 e janeiro de 1871".

Notas:

[a] 31 de março de 1869
[b] 18 de março de 1871
[c] foram encontradas 4 cartas de 1870, além de uma de 1874 e outra de 1875
[d] queda do imperador, que aconteceria em 02/09/1870
[e] plebiscito que aprovou o 2º império
[f] já sabíamos da sua participação na Liga do Ensino, fundada por Jean Macé em 1866
[g] todas as demais cartas de 1870 são de Pimprez

Referências:

[1] https://www.luzespirita.org.br/index.php?lisPage=livro&livroID=57&fbclid=IwAR0k_SrPA8mjxuRucAyj8T75kj2JOfyZtcuZK4mYz7cOBVv6YYZEOv4Lu9s
[2] https://www.facebook.com/HistoriaDoEspiritismo/posts/1031803410916774
[3] https://www.facebook.com/HistoriaDoEspiritismo/posts/1032678604162588
[4] https://www.retronews.fr/.../1-septembre.../1829/3285371/17

Fonte:

CSI do Espiritismo
AKOL - Allan Kardec Online 

Obviamente que continua o mesmo questionamento em relação à gestão de Pierre-Gaëtan Leymarie à frente da Sociedade Anônima para a continuação das obras espíritas de Allan Kardec, na qual vemos um desvirtuamento doutrinário para acolher ideias estranhas ao Espiritismo (dentre as quais concepções místicas vindos do Roustainguismo e da Teosofia), além das apropriações indevidas da própria família Leymarie do que deveria compor um patrimônio espírita; no entanto, temos que salientar que estes novos documentos só são mais e mais evidências de que as acusações que lhe foram dirigidas na tese de adulteração dos livros de Kardec são infundadas e, mediante tal esclarecimento, o prolongamento dessas acusações saem do terreno das hipóteses para o de calúnia e difamação.

Saiba mais em O caso a Gênese.

Continua...


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